Dieta ou Exercício:
O que emagrece mais?
Primeiramente, devemos diferenciar aqui o emagrecimento da perda de peso. Emagrecimento seria de fato a diminuição da gordura corporal, enquanto a perda de peso refere-se somente ao número da balança. Com relação a esses dois aspectos, vamos abordar qual o real efeito da atividade física e dieta (ou os dois juntos como intervenção). Qual a magnitude da mudança? Quais seus efeitos? O que é melhor?
Obs.: Eu não vou numerar os artigos durante a minha explicação, porque estou fazendo um apanhado de todos os estudos que li sobre o assunto, que foram muitos. Todas as referências estão no final.
Vamos começar pela pergunta:
Exercício físico sem dieta é eficaz para emagrecimento/ perda de peso?
A resposta é: somente para grandes quantidades de exercício. Mas a resposta é muito variável (vamos discutir o porquê no próximo tópico)
A grande maioria dos estudos que investigam os efeitos do exercício na perda de peso sugere que programas consistentes com os níveis mínimos de recomendações (pelas organizações e instituições de saúde) de atividade física (~150 minutos de exercício de intensidade moderada por semana) sem restrição alimentar podem induzir uma perda de peso modesta (~2-3 kg) , mas em geral é improvável que resulte em perda de peso clinicamente significativa (= 5% de perda de peso).
Os programas de exercício que excedem muito as recomendações mínimas de atividade física (cerca de 225 a 420 minutos de atividade física por semana) têm maior probabilidade de resultar em perda de peso clinicamente significativa.
Figura 1. Recomendações atuais para quantidades de atividade física com base em metas para manter a saúde, prevenção de ganho de peso, promoção de perda de peso clinicamente significativa e prevenção de ganho de peso após perda de peso bem-sucedida. As recomendações são baseadas na posição do Colégio Americano de Medicina Esportiva. Retirado de Swift et. al, 2014
Estamos falando aqui de perda de peso. Com relação ao emagrecimento, o resultado também é modesto, mas funcional. O que isso quer dizer?
O exercício por si só (mesmo sem a perda de peso), pode levar a reduções modestas (a dieta é sempre mais efetiva nesse propósito) na gordura corporal (inclusive gordura visceral) e aumento de massa magra. Isso implica em melhorias nos fatores de risco cardiometabólicos, incluindo melhorias na adiposidade, inflamação sistêmica, sensibilidade à insulina e leptina, controle glicêmico, complacência arterial, perfil lipídico e aptidão cardiorrespiratória.
Portanto, existe uma forte justificativa para os profissionais de saúde continuarem a promover programas de atividade física, mesmo em adultos que não conseguem atingir suas metas de perda de peso, pois essas melhorias cardiometabólicas estão associadas a reduções de doenças cardiovasculares (“do coração”) e mortalidade por todas as causas. Também devemos mencionar os efeitos benéficos do exercício na qualidade de vida, bem-estar mental e social, autoestima, etc
E por que há grande variabilidade na mudança corporal em resposta a uma prescrição de exercício?
De forma prática, se todo o resto permanecer o mesmo, o exercício deve promover a perda de peso aumentando o gasto calórico de forma aguda. No entanto, o aumento do gasto energético por meio de um exercício pode resultar em comportamentos compensatórios que negam o balanço energético negativo induzido pelo exercício. Esses comportamentos podem ser realizados de forma consciente ou inconsciente e incluem diminuição da atividade física não relacionada ao exercício (NEAT; atividades do dia-a-dia, domésticas, ir ao trabalho, subir escada) e/ou aumento da ingestão de energia. A magnitude dessa compensação varia entre os indivíduos. Ainda não está claro quais fatores psicossociais predizem se um indivíduo compensará durante uma intervenção de exercício, embora haja algumas evidências de que desinibição, fome e compulsão alimentar podem conferir um risco maior. Em indivíduos suscetíveis à compensação comportamental, o exercício pode não ser eficaz, a menos que possa ser implementado de uma maneira que minimize ou elimine esses comportamentos compensatórios.
Então, podemos notar que a perda de peso (e emagrecimento definitivo) dependem de uma DIETA. E não estou me referindo (ainda) ao regime alimentar, ao planejamento alimentar prescrito por nutricionista ou restrição alimentar. Estou falando no sentido real da palavra; dieta refere-se a um padrão alimentar, seja ele qual for. Nesse sentido, uma pessoa pode ter resultados satisfatórios com o exercício físico, mas somente quando não houver mudanças compensatórias na sua dieta padrão. Portanto, a alimentação é essencial!
ESTUDO…
Foster-Schubert et al. (2012) realizaram um ensaio clínico randomizado de 12 meses com 439 mulheres na pós-menopausa com sobrepeso ou obesidade. As participantes foram divididas em quatro grupos, que eram controle, apenas dieta, apenas exercício e dieta + exercício.
Em comparação com o grupo controle, todos os grupos de intervenção obtiveram reduções de peso significativamente maiores, com o grupo dieta perdendo 7,1 kg, o grupo exercício perdendo 2,0 kg e o grupo dieta + exercício perdendo 8,9 kg. Assim, a combinação de dieta e exercício mostrou reduzir o peso em maior medida em comparação com intervenções apenas com dieta, e a diferença foi estatisticamente significativa. Além disso, todos os grupos de intervenção tiveram redução significativa da circunferência de cintura (CC) e % de gordura em comparação com o grupo controle, e a redução da CC e % de gordura também foi significativamente maior no grupo dieta + exercício em comparação com o grupo apenas exercício e o grupo apenas dieta. No entanto, a redução do % de gordura no grupo somente dieta foi significativamente maior do que no grupo somente exercício.
A massa corporal magra aumentou apenas no grupo apenas de exercício (+0,3 kg). Embora a mudança do basal para 12 meses não tenha sido significativamente diferente no grupo controle, foi significativamente maior em comparação com os grupos apenas dieta e dieta + exercício (pela maior perda de peso), ambos os quais perderam massa corporal magra durante a intervenção.
No geral, os achados deste estudo mostraram benefícios clinicamente e estatisticamente significativos da dieta + exercício em relação às intervenções apenas com dieta ao considerar a perda de peso isoladamente. Além disso, parece haver um efeito mais favorável na redução do % de gordura e CC entre mulheres na pós-menopausa na condição dieta + exercício.
A sinergia entre exercício físico e dieta!
Vimos que o exercício por si só não produz grandes resultados (no emagrecimento e perda de peso, somente leve mudança de composição corporal) quando não acompanhada de uma dieta, a menos se houver grande volume de treinamento.
Isso porque o emagrecimento de fato depende de déficit calórico! Então a dieta bem prescrita é muito mais eficaz nesse sentido.
Mas as duas intervenções juntas produzem melhores resultados, principalmente a longo prazo. Elas têm um efeito sinérgico, já que o exercício promove maior controle alimentar e adesão à dieta (tem outro post sobre isso), enquanto a dieta possibilita melhor recuperação e adaptações de treinamento. Ainda, como falamos, com a dieta, há menos espaço para compensações, e o exercício entra como uma ótima estratégia para aumentar o déficit calórico.
Uma revisão sistemática de Washburn et al. (2014) examinou estudos com pelo menos 12 meses de duração. Com base nesta revisão sistemática, foi visto que a dieta produziu melhores resultados na perda de peso se comparado à intervenção de exercício aeróbico (7,2% vs. 2,4%). Ainda, concluiu-se que a atividade física combinada com a modificação da dieta resultou em maior perda de peso do que a modificação da dieta sozinha (perda de peso média de 8,8% do peso corporal inicial versus 6,9% do peso corporal inicial).
Além disso, temos que o exercício físico é um importante fator que possibilita a manutenção do peso perdido (o que é muito mais difícil que o emagrecimento em si). Mas isso está em outro post também hahah
CONCLUSÕES
Existe uma forte justificativa para a promoção de exercício/atividade física, assim como a perda de peso, para reduzir o risco cardiovascular (CV) em pacientes com sobrepeso e obesidade. Programas de treinamento consistentes com as diretrizes mínimas de atividade física (AF) (150 min/semana de AF de intensidade moderada ou 75 min/semana de AF de intensidade vigorosa) estão associados a benefícios CV para a saúde, mas resultam em modesta perda de peso. Pacientes que buscam perder peso sem alterar seus hábitos alimentares precisam ser orientados de que altos níveis de AF (225-420 min/semana de exercício) são necessários para alcançar uma perda de peso clinicamente significativa. Quando possível, a perda de peso clinicamente significativa com o treinamento aeróbico leva a melhorias maiores na sensibilidade à insulina, perfil lipídico e outros aspectos cardiometabólicos em comparação com o exercício sem perda de peso. Porém, para aqueles que não conseguem obter perda de peso clinicamente significativa, o exercício por si só também oferece benefícios cardiometabólicos, até mesmo independente da perda de peso.
A dieta deve ser o principal ponto de uma estratégia de emagrecimento, pois está ligado ao déficit calórico. Sem dieta, o exercício físico pode não proporcionar resultados satisfatórios, se compensações foram feitas. Por fim, a atividade física e dieta têm um efeito sinérgico (pessoas que praticam exercício físico têm melhor prognóstico, permanecem mais focadas e aderidas à dieta), e possibilita melhores resultados (principalmente a longo prazo) no emagrecimento e perda de peso se comparado às duas intervenções sozinhas.
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