A prevalência de sobrepeso e obesidade atingiu níveis epidêmicos em vários países. Isso tem impacto na qualidade de vida e saúde das pessoas, com consequente aumento dos custos de saúde pública e a perda de produtividade e crescimento econômico.
Exercício é muito mais que gasto calórico: tem a ver com adesão à dieta!
A prevalência de sobrepeso e obesidade atingiu níveis epidêmicos em vários países. Isso tem impacto na qualidade de vida e saúde das pessoas, com consequente aumento dos custos de saúde pública e a perda de produtividade e crescimento econômico.
Uma intervenção terapêutica para a prevenção e tratamento da obesidade é o exercício. Há evidências convincentes de que o exercício pode auxiliar na prevenção e manejo de inúmeras condições cardiometabólicas, neuromusculares, osteopáticas e psicológicas, mas seu efeito no tratamento de fato na obesidade é mais controverso. Enquanto o exercício, como uma intervenção isolada (sem dieta ou outra estratégia), promove mudança de composição corporal e perda de peso a curto prazo, o resultado varia muito de pessoa para pessoa. E grande parte dessa variação pode ser explicada pelo perfil individual, como característica restritiva ou desinibidora, que pode (ou não) compensar o gasto do exercício através de um maior consumo ou menor gasto calórico com atividades do dia a dia (NEAT).
Por outro lado, quando a atividade física é aliada a um planejamento dietético, essa é muito poderosa. As pesquisas mostram que pessoas fisicamente ativas conseguem ter maior sucesso na perda de peso e também na manutenção do peso perdido a longo prazo (o que é bem mais difícil). [1,2,3]
Mas por que isso acontece? Bom, basicamente por dois fatores: Melhor controle do apetite e do sistema de recompensa (alimentar-se por prazer, fome hedônica).
-> Atividade Física e Controle do Apetite
Primeiramente, temos a resposta aguda (principalmente na primeira hora após uma sessão de treinamento). O exercício altera o fluxo sanguíneo, a resposta hormonal gastrointestinal, o esvaziamento gástrico, o metabolismo celular muscular, a bioquímica do tecido adiposo e a atividade cerebral, o que inevitavelmente interferirá em vários dos mecanismos envolvidos no controle do apetite. As respostas agudas ao exercício incluem, principalmente, alterações nos hormônios do “apetite”, como diminuição da liberação de grelina, e aumento de GLP-1 e PYY, e podem estar relacionadas à mudança pós-exercício na fome e na ingestão de calorias (melhor controle alimentar). [4-6]
Em segundo lugar, temos os efeitos crônicos, principalmente pela melhora da composição corporal (diminuição de massa gorda e aumento de massa magra). Essas mudanças mais graduais trarão ajustes no controle tônico do apetite, em parte por um aumento na sensibilidade à insulina e à leptina. Isso significa que o exercício faz com que a ingestão alimentar seja mais compatível com o gasto calórico. [7-9]
De fato, uma meta-análise recente [9] confirma que a relação entre o nível de atividade física e a ingestão calórica pode seguir uma função curvilínea. Isso suporta a teoria postulada por Mayer et al. há quase 60 anos, da curva em “J” [10]. Olhe a imagem:
Essas são as “zonas de controle de apetite”. No trabalho de Mayer e colaboradores, em trabalhadores de fábricas cujas ocupações diárias variavam de trabalho ‘sedentário’ a trabalho ‘muito pesado’, o gasto diário e a ingestão diária de energia foram semelhantes em níveis mais altos de atividade física, mas em níveis baixos de atividade física diária, esse acoplamento foi perdido, de tal forma que a ingestão diária de energia excedeu o gasto naqueles que realizam trabalho ‘sedentário’ ou ‘leve’.
Portanto, a atividade física influencia o controle do apetite por meio de uma via dupla que aumenta a fome (para compensar o gasto), mas também a saciedade pós-refeição. Isso faz com que indivíduos fisicamente ativos mostrem melhor compensação de energia e, portanto, melhor manutenção da composição corporal a longo prazo.
-> Atividade Física e Fome Hedônica
Além dos mecanismos homeostáticos, os fatores não homeostáticos envolvidos no controle do apetite incluem a recompensa alimentar e as características do comportamento alimentar. Pensamentos hedônicos sobre alimentos e a apreciação sensorial, como sal, açúcar e gordura, determinam a preferência e a escolha dos alimentos e, assim, contribuem para o tamanho e a frequência das refeições [40]. A fome hedônica reflete dois processos separados de “gostar” e “querer”. Gostar pode ser definido como o grau de prazer sensorial obtido dos alimentos, enquanto querer é a motivação ou atração por determinados alimentos.
Uma revisão recente [12] analisou a influência da atividade física no sistema de recompensa. Estudos observacionais mostram que a atividade física moderada a vigorosa está associada a um menor GOSTO e DESEJO por alimentos com alto teor de gordura ou alto teor de energia, e maior preferência por alimentos com baixo teor de gordura/baixo teor de energia.
Então o exercício não só atua no controle do apetite, mas também no comportamento alimentar e nas escolhas feitas. Bem provável que seja por uma motivação maior (“Já que eu fiz o exercício, vou comer certinho…”), um verdadeiro compromisso com a vida saudável.
Portanto, o exercício/atividade física é muito mais que gasto calórico, e talvez este seja o aspecto menos importante.
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- Foright RM, Presby DM, Sherk VD, et al. Is regular exercise an effective strategy for weight loss maintenance?. Physiol Behav. 2018;188:86-93. doi:10.1016/j.physbeh.2018.01.025
- Johns DJ, Hartmann-Boyce J, Jebb SA, Aveyard P; Behavioural Weight Management Review Group. Diet or exercise interventions vs combined behavioral weight management programs: a systematic review and meta-analysis of direct comparisons. J Acad Nutr Diet. 2014;114(10):1557-1568. doi:10.1016/j.jand.2014.07.005
- Beaulieu K, Blundell JE, van Baak MA, et al. Effect of exercise training interventions on energy intake and appetite control in adults with overweight or obesity: A systematic review and meta-analysis. Obes Rev. 2021;22 Suppl 4(Suppl 4):e13251. doi:10.1111/obr.13251
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- Schubert MM, Sabapathy S, Leveritt M, Desbrow B. Acute exercise and hormones related to appetite regulation: a meta-analysis. Sports Med. 2014;44(3):387-403. doi:10.1007/s40279-013-0120-3
- Blundell JE, Gibbons C, Caudwell P, Finlayson G, Hopkins M. Appetite control and energy balance: impact of exercise. Obes Rev. 2015;16 Suppl 1:67-76. doi:10.1111/obr.12257
- Beaulieu K, Hopkins M, Blundell J, Finlayson G. Does Habitual Physical Activity Increase the Sensitivity of the Appetite Control System? A Systematic Review. Sports Med. 2016;46(12):1897-1919. doi:10.1007/s40279-016-0518-9
- Beaulieu K, Hopkins M, Blundell J, Finlayson G. Homeostatic and non-homeostatic appetite control along the spectrum of physical activity levels: An updated perspective. Physiol Behav. 2018;192:23-29. doi:10.1016/j.physbeh.2017.12.032
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- Beaulieu K, Oustric P, Finlayson G. The Impact of Physical Activity on Food Reward: Review and Conceptual Synthesis of Evidence from Observational, Acute, and Chronic Exercise Training Studies. Curr Obes Rep. 2020;9(2):63-80. doi:10.1007/s13679-020-00372-3
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